I. INTRODUÇÃO
Como toda e qualquer relação jurídica, a relação laboral está sujeita a existência de conflitos entre as partes, nomeadamente, trabalhador e empregador. Ocorrendo um conflito laboral, quais os passos que as partes devem dar para a sua resolução? O presente Guia Prático responderá a esta pergunta.
II. DEFINIÇÃO DE CONFLITO LABORAL
Segundo a Lei Geral do Trabalho[1], adiante LGT, os conflitos laborais podem ser individuais ou colectivo. Nos termos do n.º 1 do art.º 272. °[2]“É conflito individual de trabalho o que surja entre o trabalhador e o empregador, por motivos relacionados com a constituição, manutenção, suspensão e extinção da relação jurídico-laboral, ou com a execução do contrato de trabalho e a satisfação dos direitos e cumprimento das obrigações, de uma e de outra parte, decorrentes do mesmo contrato, bem como o recurso das medidas disciplinares aplicadas ao trabalhador.” Por outro lado, “É conflito colectivo de trabalho o que surja no âmbito de uma convenção ou de acordo colectivo de trabalho, de acordo com o previsto em legislação específica…” – n.º 2 do art.° 272.°.
De forma uma geral, sempre que existir um problema entre trabalhador e empregador sobre questões ligadas ao contrato de trabalho, estaremos diante de um conflito laboral.
No presente Guia Prático, abordaremos essencialmente o conflito individual de trabalho, sem prejuízo de, em muitos aspectos, a resolução de um conflito colectivo seguir um regime semelhante. Assim, as referências a conflito laboral serão tidas como feitas a conflito individual de trabalho.
III. O QUE FAZER QUANDO SE DEPARAR COM UMA SITUAÇÃO DE CONFLITO LABORAL?
A LGT coloca à disposição das partes em litígio, além da via judicial, 3 (três) vias extrajudiciais para a resolução do potencial conflito laboral, a saber: Mediação, Conciliação e a Arbitragem[3](n.º 1 do art.º 273.º). É importante realçar que a LGT consagra a regra da precedência obrigatória a um dos meios extrajudiciais de resolução de conflitos, ou seja, antes da apresentação do problema a um tribunal, as partes devem, primeiro, tentar a resolução através de um dos meios acima referidos (n.º 1 do art.º 274.º).[4]
IV. MEDIAÇÃO
Nos termos da LGT, a Mediação é da competência da Inspecção Geral do Trabalho, adiante IGT[5] (art.° 275. °). A Mediação inicia com um requerimento do interessado (trabalhador ou empregador), que pode ser apresentado de forma oral, devendo os serviços competentes da IGT reduzi-lo a escrito (n.º 2 do art.º 276.º). [6]
No requerimento, o interessado deve indicar as matérias em conflito, bem como fornecer todos os elementos que possam contribuir para a resolução do conflito (n.º 3 do art.º 276.º). VIDE ANEXO I - MINUTA DE REQUERIMENTO DE MEDIAÇÃO.
a. PROCEDIMENTO
Após a recepção do requerimento, a IGT deve notificar as partes para audiência no prazo de dez (10) dias úteis. Actualmente, este prazo é tido como meramente formal, uma vez que a IGT, na maior parte das vezes, leva mais de 1 (um) mês para marcar a audiência de Mediação[7]. VIDE ANEXO II – AVISO DE COMPARÊNCIA.
Na audiência de Mediação os inspectores do trabalho[8] procuram perceber o problema existente entre as partes e verificam a possibilidade de acordo. Se for alcançado um acordo, deve ser reduzido à escrito e assinado pelas partes (n.º 3 do art.º 277.º)[9]
As partes não são obrigadas a constituírem advogados. No entanto, se pretenderem, podem constituir advogados (art.º 278.º conjugado com os n.ºs 4 e 5 do art.º 286.º)
b. CASOS DE IMPOSSIBILIDADE DE ACORDO
A IGT deve emitir uma declaração de impossibilidade de acordo nos seguintes casos:
1. Se as partes não chegarem a acordo;
2. Se uma das partes faltar e não justificar a ausência, justifica-la fora do prazo ou a justificação não ser atendida;
3. Caso tenha sido alcançado um acordo parcial;
A Declaração de Impossibilidade determina o fim da Mediação, permitindo à parte interessada a possibilidade de intentar uma acção judicial, no prazo de trinta (30) dias, devendo para o efeito juntar a declaração de impossibilidade de obtenção de acordo ou a acta da reunião onde constem os termos da mediação. (n.º 5 do art.º 277.º, art.º 282.º). VIDE ANEXO III – DECLARAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE. DE OBTENÇÃO DE ACORDO.
[1] Lei 7/15 de 15 de Junho. [2] . As referências legais no presente Guia Prático são inerentes à LGT, salvo especificação especial. [3] Por não ser muito comum na nossa realidade laboral, não analisaremos o regime jurídico da Arbitragem. [4] Existe uma discussão sobre se a regra da precedência obrigatória viola ou não o princípio constitucional da tutela jurisdicional efectiva, nos termos do n.º 1 do art.º 29.º da CRA, segundo o qual “a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos…”. Estamos inclinados à tese da não violação, uma vez que a precedência obrigatória não coloca em causa o direito dos cidadãos de aceder aos tribunais. Outrossim, os meios extrajudiciais de resolução de litígio constituem verdadeiras vias para a materialização da defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. [5] O Estatuto Orgânico da IGT foi aprovado pelo Decreto Presidencial nº 79/15, de 13 de Abril. A sede da IGT encontra-se em Luanda, Av. do 1.º Congresso do MPLA. Em Luanda, as mediações ocorrem nos serviços centrais (Rua da Missão, 123, 4º - Prédio da TAAG) e provinciais (Rua da Ferreira do Amaral n.º 77). [6]É importante referir que, à presente data, desconhecemos casos em que a IGT promoveu uma Mediação mediante solicitação verbal. A prática tem demonstrado que os serviços da IGT solicitam sempre um requerimento escrito por parte do interessado que, na maior parte das vezes é o trabalhador. Hoje, em muitas repartições da IGT já se encontra disponível uma ficha modelo para o efeito. Este procedimento restringe um direito consagrado na LGT: o de apresentar o requerimento verbalmente. [7] A nossa abordagem tem como referência a realidade de Luanda. [8] Os inspectores do trabalho na sua maioria, não são formados em Direito, existindo igualmente alguns casos de inspectores não licenciados, ou seja, técnicos médios. [9] O acordo não poderá contrariar normas legais imperativas, incluir disposições menos favoráveis para o trabalhador do que o consagrado na lei, incluir disposições sobre regimes fiscais nem limitar os poderes de organização e de direcção da entidade empregadora.