POR JOSÉ MAIANDI
I. INTRODUÇÃO
O termo publicidade, teve a sua origem no vocábulo em latim publicus, que em português significa tornar público. Em termos gerais, publicidade envolve divulgar ou tornar público um facto ou uma ideia. É uma técnica de comunicação em massa, cuja finalidade é fornecer informações sobre produtos ou serviços com fins comerciais [e não só] [1]. Apesar de permitida, a publicidade feita por profissionais forenses, mormente, advogados, está sujeita a determinados limites, não se confundindo com o tipo de publicidade permitida às entidades comerciais e ou equiparadas.
No presente artigo, pretendemos partilhar algumas notas fundamentais sobre a regulação da publicidade do advogado no Ordenamento Jurídico Angolano.
II. REGIME JURÍDICO DA PUBLICIDADE DO ADVOGADO NO ORDENAMENTO ANGOLANO[2]
O regime jurídico inerente à publicidade do advogado, no Ordenamento Jurídico Angolano, encontra-se regulado fundamentalmente nos seguintes diplomas:
1. ESTATUTOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS - Decreto 28/96, de 13 de Setembro - Aprova o Estatuto da Ordem dos Advogados. Decreto 56/05, de 15 de Agosto - De alteração aos estatutos da Ordem dos Advogados, adiante EOAA;
2. CÓDIGO DE ÉTICA E DEONTOLOGIA PROFISSIONAL - Aprovado em Assembleia Geral de Advogados, nos dias 20 e 21 de Novembro de 2003, adiante CEDP;
3. INSTRUTITVO SOBRE PUBLICIDADE - Aprovado em reunião do Conselho Nacional da Ordem dos Advogados, aos 21 de Maio de 1999;
4. LEI DAS SOCIEDADES E ASSOCIAÇÕES DE ADVOGADOS – Lei 16/16 de 30 de Setembro;
5. LEI GERAL DA PUBLICIDADE - Lei 9/17 de 13 de Março (n.º 1 do art.º 4.º).
A possibilidade conferida ao advogado de publicitar, dentro dos limites legais, a sua actividade deriva, dentre muitos aspectos, da necessidade de informar à comunidade, onde se encontra inserido, da existência de uma instituição (individual ou colectiva) que presta serviços jurídicos, ou seja, que pratica os actos próprios do advogado. Disto resulta a necessidade de o advogado não ser uma entidade oculta ou invisível à sociedade, pois, além de ser uma instituição essencial à administração da justiça (n.º 1 do art.º 193.º da Constituição da República de Angola, adiante CRA), também constitui um pilar para o exercício de vários direitos fundamentais do cidadão. Assim, por intermédio da publicidade, o advogado será facilmente encontrado.
III. ESTATUTOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS DE ANGOLA
O artigo 64.º dos EOAA, sob a epígrafe “publicidade”, consagra em linhas gerais os aspectos fundamentais da publicidade do advogado. Nos termos do n.º 1 do referido artigo, determina-se a proibição de o advogado partilhar em qualquer meio público, directa ou indirectamente, os nomes dos seus clientes. No entanto, permite-se ao advogado a informação directa, sem divulgação pública, a futuros clientes que o solicitem, da lista dos principais clientes do advogado (al. a) do n.º 6 do art.º 64.º). Em geral, é comum essa divulgação privada ocorrer por meio de uma carta de apresentação devidamente solicitada pelo prospectivo cliente.
Para divulgar a sua actividade, ao advogado é permitido o uso de tabuletas afixadas no exterior dos escritórios ou em publicações desde que com simples menção do nome do advogado, endereço do escritório e horas de expediente (n.º 4 do art.º 64.º dos EOAA). Da leitura desta disposição, podemos levantar as seguintes questões: o que deve ser entendido como tabuleta? Qual deve ser a sua dimensão?Pode ser luminosa? Os nossos regulamentos não fornecem as respostas. O conceito de tabuleta de 1996 não é o mesmo de 2021. É nosso entendimento de que tabuleta consitirá num quadro, placa, letreiro ou objecto equivalente com a indicação das informações permitidas pelos EOAA. Na nossa praça são várias as formas de tabuletas encontradas (lona, vinil, letreiros, etc). Uma ala mais conservadora de advogados mostra-se muito sensível a tabuletas com dimensões mais vistosas. O certo é que os nossos normativos não determinam qualquer dimensão que as mesmas devam ter.
Ao advogado é igualmente permitido a indicação de títulos académicos, a menção de cargos exercidos na Ordem ou a referência a sociedade civil profissional de que o advogado seja sócio (n.º 3 do art.º 64.º dos EOAA). Desta disposição normativa depreende-se que os advogados que exercerem algum cargo nos órgãos sociais da OAA, podem utilizar o respectivo título no exercício da sua profissão. Essa permissão feita pelos EOAA reflecte uma forma de reconhecimento àqueles que fizeram/fazem parte dos órgãos sociais da OAA.[3] Assim, estes advogados teriam a oportunidade de, dentro dos limites legais, utilizarem os títulos inerentes ao cargo exercidos na OAA. É digno de nota que “o advogado que tenha exercido cargos nos órgãos da Ordem dos Advogados conserva, honorariamente, a designação correspondente ao cargo mais alto que haja ocupado” – art.º 23.º dos EOAA.
Os EOAA consagram ainda a possibilidade de o advogado ter um site na internet, desde que apenas refira os nomes dos advogados, sua especialidade e endereço de escritório (al. b) do n.º 6 do art.º 64.º). Neste particular, a prática visível na nossa praça é diferente. Vários sites de advogados contemplam outras informações como por exemplo: área de recrutamento, notícias recentes sobre o escritório, parcerias, artigos publicados, newsletter, formações, etc. É compreensível esta evolução em função das constantes transformações que a advocacia tem sofrido a nível mundial, e Angola não constitui excepção. Não vemos incovenientes no uso das mais variadas redes sociais pelos advogados, mormente, Linkedin, Facebook, Youtube, WhatsApp, Instagram, etc, desde que observadas as limitações próprias da profissão.
Nas publicações especializadas de advogados pode ainda inserir-se curriculum vitae académico e profissional do advogado e eventual referência à sua especialização, se previamente reconhecida pela Ordem dos Advogados (n.º 5 do art.º 64.º dos EOAA).[4] Da análise desta disposição, podem surgir as seguintes questões: O que deve ser considerada publicação especializada de advogados? Apenas aquelas de iniciativas da própria OAA, nomeadamente a Revista da OAA “ROAA” e a Gazeta do Advogado ou podemos incluir publicações feitas em um outro canal jurídico, por exemplo na IURISBOOK[5]? Num artigo jurídico o advogado pode colocar o seu curriculum viate académico e profissional “CV”? Em nosso ver, o advogado pode fazer recurso a outros canais jurídicos para a divulgação dos respectivo artigos, fazendo referência ao seu CV. Neste quesito, podemos levantar outra questão: O que deve constar no CV do advogado? Os nossos regulamentos também não respondem, existindo maior liberdade para o advogado na respectiva redacção do documento, desde que não viole os elementos basilares da profissão, por exemplo, colocar o nome dos seus clientes ou processos que esteja a patrocinar.
IV. INSTRUTITVO SOBRE PUBLICIDADE
Da análisa ao Instrutitvo sobre Publicidade, aprovado em reunião do Conselho Nacional da Ordem dos Advogados, aos 21 de Maio de 1999, resulta claro que o referido instrutivo encontra-se desactualizado com o contexto actual de desenvolvimento da advocacia. No entanto, podemos destacar vários aspectos importantes sobre o regime nele constante. Por exemplo, o n.º 1 do art.º 2.º reitera que “o exercício da profissão, a identificação pública será feita por meio de tabuleta, a afixar no exterior do escritório ou do edifício em que o mesmo esteja incorporado, e pela inclusão do nome do profissional ou dos profissionais seguido da palavra “advogado” ou “advogados” conforme o caso, podendo igualmente incluir o endereço e as horas normais de expediente”. Aqui vale lembrar que os advogados que exerçam a actividade a título individual devem identificar na sua tabuleta a expressão advogado e não “advogados”, conforme temos verficado em muitos casos na nossa praça jurídica.
Os Advogados podem, nos documentos profissionais, fazer referência a títulos académicos, à inscrição na Ordem e a cargos nela exercidos, a ligações a outros escritórios de Advogados e a organizações nacionais ou internacionais de advogados (n.º 2). Não é muito comum hoje ver nas peças processuais dos advogados muitas referências títulos, no entanto, os nossos normativos permitem esta possibilidade. Assim, não será incorrecto para o advogado, numa determinada peça processual, assinar como Advogado e Mestre em Direito Empresarial, ou Advogado e Membro do Conselho Provincial de Benguela.
É permitida a divulgação do nome do advogado e respectivo endereço profissional, bem como os elementos referidos nos números anteriores, em Jornais, Listas, telefónicas e similares e por intermédio da Internet (n.º 3). Os advogados e advogados estagiários devem fazer referência à sua qualidade nos seus documentos profissionais e na correspondência que assinem (n.º 4). Aqui, é importante uma nota aos nossos colegas advogados estagiários: não devem identificar-se como “Advogado E”, “AE” ou Advogado, mas sim Advogado Estagiário[6].
Nesta ordem de ideia, o Advogado e o Advogado Estagiário estão obrigados a identificarem-se de forma clara, inequívoca e por extenso, nesta qualidade, indicando sempre nas suas peças processuais, procurações ou outros documentos profissionais que são Advogados ou Advogados Estagiários, conforme exemplificado abaixo:
JOSÉ MAIANDI
_______________________________
ADVOGADO
Cédula Profissional. nº 2262
NIF 001038274LA038
O instrtutivo proibe expressamente aos advogados na sua identificação pública e na prática de actos próprios da profissão a menção a quaisquer títulos ou funções não relacionadas com a profissão, a eventuais ligações a instituições públicas ou privadas, a menção ao desenvolvimento de actividades políticas , empresarias ou de outra natureza, ao exercício profissional exclusivo em escritórios estrangeiros ligados a outras Ordens, sem prejuízo da inserção em revistas e outras publicações especializadas de Advogados, de curriculum vitae académico e profissional de Advogado bem como a referência à sua especialização, se previamente reconhecida pela Ordem dos Advogados (art.º 3.º). Assim, o advogado não deve colocar nos cartões-de-visita Advogado e Chefe de Departamento do Ministério das Finanças, Advogado e Assessor do Presidente da República, ou Advogado e Empresário.
O art.º 4.º veda aos advogados a realização de toda a espécie de publicidade por meios de circulares ou anúncios nos meios de comunicação social ou qualquer outra forma directa ou indirecta de publicidade profissional, designadamente divulgando os nomes dos seus clientes. Os advogados não devem igualemente fomentar, nem autorizar a publicação de noticias referentes a causas judicias ou outras questões profissionais a si confiadas, não promovendo a discussão ou a contribuição para discussão, em público ou nos meios de comunicação social, de questões pendentes ou a instaurar perante os ltribunais ou outros órgãos do Estado, salvo nos casos em que expressamente o Conselho Provincial autorizar por concordar, fundadamente, com a necessidade de uma explicação pública e, nesse caso, nos precisos termos da autorização. É digno de nota que as violações das normas relativas à publicidade configuram infracção disciplinar e como tal sujeitas à responsabilidade disciplinar.
V. CÓDIGO DE ÉTICA E DEONTOLOGIA PROFISSIONAL
O CEDP regula a matéria sobre a publicidade fundamentalmente nos art.ºs 7.º e 8.º, reiterando os aspectos contidos nos EOAA, bem como no instrutivo. No entanto, consagra a questão da concorrêncial desleal (art.º 8.º), proibindo ao advogado:
§ A prática de actos que contrariem a lei que protege a concorrência[7];
§ A utilização de procedimentos publicitários directos e indirectos contrários às disposições da Lei sobre Publicidade[8] e às normas específicas sobre publicidade previstas no presente código e nos EOAA;
§ Angariar clientes, directa ou indirectamente, por forma atentória da dignidade das pessoas ou da função social da advocacia;
§ A recepção de pagamentos ou de contraprestações em violação das normas do Estatuto da Ordem dos Advogados ou das previstas no Código Deontológico;
Ainda no CEDP o artigo 7.º, sobre a epígrafe publicidade, consagra exaustivamente o seguinte:
1. O Advogado pode realizar publicidade que seja digna, leal e condizente com os seus serviços profissionais, desde que em absoluto respeito pela dignidade das pessoas, pela legislação em vigor e pelas normas do presente código.
2. Em particular é vedado ao Advogado:
a) Revelar, directa ou indirectamente, factos, dados ou situações sujeitas ao segredo profissional como as referentes a causas judiciais ou outras questões profissionais a si confiadas;
b) Revelar situações que afectem a sua independência;
c) Prometer a obtenção de resultados que não dependam exclusivamente da actividade do próprio Advogado que faz a publicidade;
d) Fazer referência directa ou indirecta, pelos meios de comunicação social ou por qualquer outra forma, nomeadamente circulares e anúncios, a clientes que utilizam os serviços do próprio Advogado, divulgando os nomes, os assuntos por estes levados, os êxitos e respectivos resultados;
e) Dirigir-se, directamente ou por terceiros, a vítimas, pessoais ou colectivas, seus herdeiros ou pessoas com esses relacionadas, de catástrofes naturais, de acidentes ou outras situações calamitosas que necessitem de plena liberdade para decidir da escolha de um Advogado e não o possam fazer em virtude da situação em que se encontram;
f) Estabelecer comparações públicas com a actividade de outros Advogados em concreto ou através de afirmações infundadas;
g) Utilizar no exercício da advocacia cartões ou títulos que derivem de outras funções ou actividades de que o Advogado seja também titular.
h) Utilizar para sua identificação emblemas, símbolos ou outros indicativos colectivos relativos à Ordem dos Advogados de Angola que possam pela semelhança induzir à confusão, uma vez que apenas podem ser utilizados para publicidade institucional;
i) Incitar genérica ou concretamente à litigância e ao conflito;
j) Utilizar meios ou conteúdos contrários à dignidade das pessoas, da advocacia e da Justiça:
3. Não constitui publicidade a indicação de títulos académicos, a menção de cargos exercidos na Ordem dos Advogados de Angola ou a referência à sociedade civil de que o Advogado seja sócio.
4. Não constitui também publicidade o uso de tabuletas afixadas no exterior dos escritórios ou em publicações desde que com simples menção do nome do Advogado, endereço do escritório e horas de expediente.
5. Nas publicações especializadas de Advogados pode ainda inserir-se curriculum vitae académico e profissional do Advogado e eventual referência à sua especialização, se esta estiver previamente reconhecida pela Ordem dos Advogados de Angola.
VI. CONCLUSÃO
Como podemos analisar, apesar de permitida, a publicidade feita por advogados, está sujeita a determinados limites, não se confundindo com o tipo de publicidade permitida às entidades comerciais e ou equiparadas e o seu regime jurídico no Ordenamento Jurídico Angolano encontra-se estipulado em vários diplomas, sendo que, os diplomas fundamentais apresentam-se muito desactualizados com o contexto mundial e nacional da advocacia. Por esta razão, torna-se necessária a urgente promoção pelos órgãos da OAA, nomeadamente, Conselho Nacional e Conselhos Provinciais e Interprovinciais, da discussão geral e consequente actualização dos nossos normativos inerentes à publicidade, sob pena de continuarmos a registar inúmeros atropelos aos mesmos, por um lado, e especulações de violações pela ala de advogados mais tradicional, por outro lado. Até lá, deixamos neste artigo o nosso pequeno contributo.
VII. BIBLIOGRAFIA E LEGISLAÇÃO UTILIZADA
§ MAIANDI, JOSÉ – ARTIGO JURÍDICO - O QUE TODO ADVOGADO ESTAGIÁRIO DEVIA SABER – PARTE 3, IURISBOOK, 26 de Março de 2019 (https://www.facebook.com/iurisbook/photos/a.258424691234910/573096329767743/)
§ Constituição da República de Angola;
§ ESTATUTOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS - Decreto 28/96, de 13 de Setembro - Aprova o Estatuto da Ordem dos Advogados. Decreto 56/05, de 15 de Agosto - De alteração aos estatutos da Ordem dos Advogados, adiante EOAA;
§ CÓDIGO DE ÉTICA E DEONTOLOGIA PROFISSIONAL - Aprovado em Assembleia Geral de Advogados, nos dias 20 e 21 de Novembro de 2003, adiante CEDP;
§ INSTRUTITVO SOBRE PUBLICIDADE - Aprovado em reunião do Conselho Nacional da Ordem dos Advogados, aos 21 de Maio de 1999;
§ LEI DAS SOCIEDADES E ASSOCIAÇÕES DE ADVOGADOS – Lei 16/16 de 30 de Setembro;
§ LEI GERAL DA PUBLICIDADE - Lei 9/17 de 13 de Março.
[1] https://www.significados.com.br/publicidade/ consulta feita às 20h00 do dia 15 de Novembro de 2021 [2] Não analisaremos ao detalhe o regime jurídico constante na Lei Geral da Publicidade e na Lei das Sociedades e Associações de Advogados. [3] Actualmente, os cargos na OAA são exercidos sem qualquer contrapartida remuneratória. Somos de opinião que o exercício de determinados deviam ser remunerados, desde que a pessoa a exercer suspendesse o exercício da advocacia, pois estaria mais focado e disponível para a resolução dos grandes problemas da classe. É digno de nota que os nossos normativos não proíbem a possibilidade remuneratório. [4] À presente data, desconhecemos a existência de um procedimento utilizado pela OAA para o reconhecimento de especializações feitas pelos advogados. [5] A IURISBOOK é um canal jurídico de matriz angolana (www.facebook.com/iurisbook) [6] Esta obrigação vem reforçada no art.º 30.º do Regulamento de Acesso à Advocacia a sob a epígrafe “Indicação da qualidade de Estagiário”, “O Advogado Estagiário deve identificar-se sempre nessa qualidade quando se apresente ou intervenha em qualquer acto de natureza profissional” – artigo jurídico de José Maiandi – O QUE TODO O ADVOGADO ESTAGIÁRIO DEVIA SABER PARTE 3 – publicado no canal jurídico IURISBOOK. [7] Lei n.º 5/18 de 10 de Maio - Lei da Concorrência [8] Lei 9/17 de 13 de Março